Velozes e furiosos: o que os jovens condutores têm na cabeça?

 

Garotos e garotas que mal saíram das fraldas da prova prática do Detran e assumem o volante e os riscos de matarem a si próprios e aos outros numa combinação fatal de imperícia, imprudência e negligência.



As notícias que lemos, vimos e ouvimos nessa semana sobre acidentes e mortes com jovens condutores ainda na habilitação provisória são alarmantes e chegam a ser chocantes.


No litoral de São Paulo uma moça de 19 anos acelerou até 170km/h, bateu contra a pilastra de sustentação de uma ponte e antes de morrer ainda fez foto do velocímetro.

 

Fonte: Portal do Trânsito


Fico pensando na intenção dessa jovem condutora ao fotografar o velocímetro em 170km/h. Para postar nas redes sociais? Para mostrar aos amigos? Para se autoafirmar? A resposta morreu com ela.


Em Santa Catarina um garoto de 18 anos, recém habilitado, pegou a rodovia, acelerou demais, perdeu o controle do carro e morreu prensado contra uma árvore deixando a carona em estado grave.


Um dos casos que mais chocou Blumenau foi a morte de 4 jovens num acidente besta em pleno centro da cidade: eram cinco ocupantes do carro, passaram o dia bebendo num posto de gasolina e no trajeto a combinação de alta velocidade, bebida alcoólica e falta de cinto de segurança matou quatro deles. Uma passageira tinha só 15 anos e o mais velho 31 anos. De cara, dois morreram na hora arremessados pelo para-brisas do carro.


São tantos e tantos os casos, incontáveis, que o risco maior começa a ser de naturalização deste tipo de acidente e nos faz perguntar: o que essa juventude tem na cabeça?


As estatísticas aumentam a cada dia quanto ao número de acidentes, mas há anos estão congeladas quanto às causas ligadas ao comportamento desafiador e negligente de motoristas e caronas mais jovens.


Classicamente, são sempre os mais jovens e com menos tempo de habilitação os que mais se envolvem em acidentes com mortes, mas isso parece entrar por um ouvido dessa garotada e sair pelo outro.


Não são poucas as reportagens, fotos e vídeos em que vemos garotões se exibindo em verdadeiros malabarismos em cima das motos, em alta velocidade, deitados e trocando marchas com as mãos. Ou em rachas em que tentam ser ainda mais velozes e furiosos.


Tem material de sobra nas redes sociais de jovens condutores se exibindo em rachas, bebendo e dirigindo, de bandas que fazem apologia à bebida, direção e comportamento irreverente. Tudo isso num país em que as vias públicas estão virando campo de extermínio, em que a violência dos traumas tem sido cada vez maior e os hospitais não dão conta de atender sequer os que adoecem por causas naturais.


Sabemos que uma das características da adolescência e juventude são a irreverência, a necessidade de autoafirmação, de aceitação no grupo, os problemas com figuras de autoridade e a necessidade de quebrar regras para aumentar a admiração de seus pares.


Pensar que não vai acontecer nada com eles, que estão acima do bem e do mal e que correr riscos desafiando a velocidade é um ato de heroísmo faz parte do perfil dos adolescentes. Mas, isso não justifica. Porque eles podem ter esse perfil descrito pelas teorias de desenvolvimento da Psicologia, mas não são tapados. Fazem parte da geração Y, aquela que nasce debruçada na tecnologia, que tem acesso a informação na ponta dos dedos em qualquer lugar.


O mesmo celular de última geração que usam para tirar fotos é o mesmo que lhes dá acesso a informação, aos casos de milhares de outros jovens como eles que pagam caro pela irreverência. Que ficam mutilados e inválidos para o resto da vida em acidentes violentos que poderiam ser evitados, mas que, infelizmente, não lhes serve de exemplo.


Fico pensando nos pais dessas crianças mortas em acidentes de trânsito deste tipo. Na dificuldade que eles tem para educar seus filhos nesses tempos de permissividade exagerada em que o filho mal completa 18 anos e já ganha carros potentes para se exibir entre os amigos.


Tempos em que os pais trabalham demais, tem pouco tempo para conversar e construir limites com os filhos. Tempos bem diferentes daqueles em que a juventude transviada do passado matava e morria menos.


Em São Paulo um garoto alcoolizado e sem habilitação caiu numa blitz e chamou um amigo também sem habilitação para socorrê-lo. Não consigo entender que os pais não saibam o que seus filhos estão fazendo ou com quem estão aprendendo a dirigir antes do tempo. Infelizmente, muitos pais ainda colocam os carros nas mãos do filho e são seus próprios “instrutores” quando a primeira lição de berço deveria ser responsabilidade e respeito às leis.


Muito me preocupa também essa apologia ao veículo, aos ideais de felicidade ligados ao carro, essa tentativa de lavagem cerebral da mídia que faz as pessoas acreditarem que brasileiro é apaixonado pelo carro quando na verdade deveria ser apaixonado é pela vida.


O mais preocupante é o quanto isso influencia a juventude diante de um perfil desafiador que mistura as crises de identidade de Erickson com a irreverência e a falta de responsabilidade mencionada em todas as literaturas sobre o comportamento dos mais jovens.


Lamentar e contar os mortos com pouca idade em acidentes de trânsito é muito pouco. Nós, os pais e a sociedade, estamos pagando um preço muito caro e o que essa juventude tem na cabeça não é a única pergunta para a qual temos de buscar respostas.



Outra pergunta que não quer calar é: o que cada um de nós pode fazer para evitar essas mortes prematuras no trânsito?



 

 Fonte: Portal do Trânsito