Juristas defendem exame toxicológico para todos os motoristas.

No Brasil, o custo anual com acidentes e vítimas do trânsito é de R$ 50 bilhões — R$ 137 milhões por dia. Somos o terceiro país que mais mata no trânsito no mundo — só ficamos atrás da China e da Índia, países com número de habitantes na casa do bilhão. Nas rodovias federais, 38% dos acidentes envolvem veículos pesados, apesar de representarem apenas 4% da frota nacional.

Há um ano, tornou-se obrigatória a realização do exame toxicológico para motoristas profissionais. A medida vale para a emissão e a renovação da CNH, na admissão e no desligamento dos motoristas profissionais. Esta é a primeira medida para combater o uso de drogas por condutores desde que o Código de Trânsito Brasileiro entrou em vigor, em janeiro de 1998. Um balanço dos resultados dessa implantação do teste toxicológico foi tema de um seminário realizado no Correio para discutir o uso de drogas pelos motoristas profissionais nas estradas brasileiras. 

Juristas especializados no tema defendem que o exame também se estenda para outras categorias. “Ninguém pode se transformar em instrumento de morte. O motorista profissional não pode transportar carga ou passageiros sob a influência de drogas, o que deve preponderar é a supremacia do interesse público: a proteção da vida, da saúde e da paz nas estradas brasileiras”, afirmou o ex-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Marcus Vinícius Furtado Coêlho.

A constitucionalidade da realização obrigatória do exame é discutida no Supremo Tribunal Federal, que avalia como a determinação apenas para motoristas profissionais violaria o princípio da isonomia e que o exame não seria meio adequado à garantia da segurança do trânsito. A Advocacia-Geral da União (AGU), em resposta, defendeu a utilização do exame e alegou que a obrigatoriedade garante a segurança dos motoristas e dos demais usuários das rodovias. “Os profissionais devem se submeter às normas de segurança que garantam tanto a saúde física do trabalhador quanto dos demais indivíduos”, aponta o documento.

Para o doutor em direito, o exame é uma medida importante, uma vez que o uso regular de drogas provoca incapacitação permanente do indivíduo para o exercício de profissões de risco. “Quando o usuário regular não está sob o efeito das drogas está sob o efeito igualmente nocivo da síndrome de abstinência. O trânsito seguro é um direito de todos e dever dos órgãos reguladores’', comentou Furtado.

“O motorista profissional é desafiado a se submeter a extensas jornadas em busca de melhor remuneração, o que gera consequências danosas de toda ordem, para os próprios trabalhadores e para os demais usuários de rodovias, sob a forma de risco elevado e evitável de acidentes”, contou o ex-presidente da OAB.

“A determinação do exame é adequada, pois reprime a utilização de psicoativos e promove a segurança no trânsito, além de limitar o livre exercício da profissão de motorista em benefício da vida dos próprios trabalhadores e dos indivíduos que trafegam nas vias”, refletiu. Ele ainda destacou que a intimidade do profissional é garantida, pois o teste prevê a confidencialidade do resultado.
 

Legislação é branda

Mesmo com leis brandas de punição para quem causa acidentes de trânsito por estar sob efeito de drogas, o desembargador e ex-presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), Henrique Nelson Calandra, acredita que o judiciário tem ouvido a sociedade. “O exame toxicológico, aliado a outras tecnologias, chega em um momento em que a justiça conta com processos aos milhões”, afirmou.

Após a edição da Lei 13.103/2015, os Departamentos de Trânsito de vários estados entraram na justiça com liminares para derrubar a obrigatoriedade do exame. Porém, até o momento, a lei está válida em todo território nacional, e o  Amapá, Ceará, Espirito Santo, Minas Gerais e Santa Catarina  se apresentaram em defesa da aplicação dos testes. “Em São Paulo, um desembargador se pronunciou a favor, caçando uma liminar de primeiro grau. E a OAB nacional também é favorável à  medida”.

O desembargador relatou que foi vítima de um grave acidente de trânsito durante a década de 1970. “Um ônibus entrou na contramão e atropelou várias pessoas em uma parada lotada e esmagou meu carro contra a parede. Tive cinco paradas cardíacas, mas sobrevivi”, contou emocionado.

Ele também defende a expansão do teste para outras categorias. “É uma ferramenta de controle para que pessoas não habilitadas para dirigir não tirem a vida e o patrimônio de outras”, afirmou.

Direitos

Calandra defende a nova legislação, pois o teste não vem para restringir direito ou discriminar ninguém. “No Brasil, as pessoas querem ver respeitados os seus direitos, mas ninguém quer saber de cumprir as suas obrigações”,frisou. Para ele, é por meio do caminho trilhado pela comunidade civil e pelo parlamento brasileiro que a sociedade consegue dar passos importantes para evitar os crimes no trânsito.

 

FONTE: Correio Braziliense