Código de Trânsito Brasileiro completa 18 anos de vigência

Na maioridade do CTB, especialistas comentam avanços e desafios da legislação de trânsito no Brasil
 
CTB (Código de Trânsito Brasileiro) chega, nesta sexta-feira (22), à maioridade: há 18 anos, a nova legislação de trânsito entrou em vigor. Nesse período, impôs mudanças significativas de comportamento e trouxe diversos avanços. Mas também passou por muitas mudanças, que causam confusão, e não foi totalmente regulamentado pelo Contran (Conselho Nacional de Trânsito), a quem cabe, segundo o próprio Código, estabelecer como implementar alguns de seus artigos. 

Brasil está à frente da maioria das nações

O texto do CTB contempla a maioria dos aspectos considerados mais importantes pela OMS (Organização Mundial da Saúde) para aumentar a segurança nas vias, com leis que tratam de álcool e direção, uso de capacete e do cinto de segurança, além de normas sobre dispositivos de segurança para crianças. Esses são temas que já estão na rotina dos brasileiros, mas não são realidade na maior parcela das nações. 

Apenas 34 países, com 30% da população mundial, punem a embriaguez ao volante; 17% da população mundial está nos 53 países que tratam, legalmente, do uso de equipamentos de segurança para crianças; e apenas 44 nações, também com 17% da população mundial, têm legislação que obriga uso de capacete para andar de moto. No caso do cinto de segurança, a situação é um pouco melhor: 67% das pessoas vivem nos 105 países em que o dispositivo é uma exigência. 

Os dados são do relatório global sobre segurança viária da OMS de 2015. Pelo documento, o Brasil ainda precisaria limitar a velocidade em vias urbanas a 50 km/h, para reduzir a gravidade de acidentes nas cidades. Esse tipo de lei está presente em 47 países (13% da população mundial). 

Em 18 anos, 575 resoluções de trânsito

A legislação é elogiada, mas o problema é a complexidade e as constantes mudanças, que dificultam sua compreensão e aplicação, conforme o especialista em direito do trânsito e comentarista do site CTB Digital, Julyver Modesto de Araujo. 

Segundo ele, desde 1998 até agora, o Contran já publicou 575 resoluções, sendo que parte delas modificaram resoluções anteriores. “São normas que dificultam o conhecimento completo da legislação de trânsito. E ainda existem questões que reclamam regulamentação, mas isso ainda não ocorreu”, diz. Um exemplo é a utilização de vestuário apropriado para motociclistas e passageiros de motos. “Existe a necessidade, prevista nos artigos 54 e 55, a infração, no artigo 244, mas não se sabe como é esse vestuário”, esclarece. 

Ainda segundo Julyver Araujo, “nessas mudanças frequentes, muitas vezes se elabora uma norma sem discussão adequada, sem saber se aquilo deve trazer benefícios de fato”. Foi o que ocorreu com o extintor de incêndio ABC: primeiro, uma resolução obrigou que todos os veículos tivessem o equipamento. Depois, o Contran revogou a determinação e passou a entender que o extintor deve ser acessório opcional. 

 

Por outro lado, algumas dessas modificações foram relevantes. A resolução 168, de 2004, é um caso. Foram 15 alterações, segundo o observador certificado do ONSV (Observatório Nacional de Segurança Viária), tenente-coronel Ordeli Savedra Gomes. Elas tornaram mais rigoroso o processo de formação de condutores. “Até a vigência do código, as pessoas não eram obrigadas a fazer aulas teóricas e práticas na autoescola”, lembra. “O CTB, primeiro, estabeleceu 20 horas/aulas teóricas e 10 horas de prática. Hoje são 45 horas/aula teóricas e 25 horas/aula práticas. São mudanças que trouxeram aspectos positivos”, avalia. Das 25 horas práticas, cinco horas são com simulador veicular, que se tornou obrigatório desde 1º de janeiro deste ano – alteração mais recente. 

Para Julyver Araujo, as modificações devem parar por aí, porque as exigências já oferecem condições de formar bons motoristas. Mas reforça que é preciso aplicar a lei com qualidade: “Exigir dos instrutores uma formação adequada, que ministrem as aulas para atingir os objetivos da segurança viária, não apenas transmitir o que cai na prova”.

28 leis alteraram o CTB em 18 anos

Mas se a sociedade muda, a legislação precisa acompanhá-la. Nesses 18 anos, conforme o tenente-coronel Ordeli Gomes, foram 28 novas leis que alteraram o Código de Trânsito Brasileiro.  Algumas foram importantes para aumentar a segurança, como o agravamento da punição para quem bebe e dirige, faz manobras ou ultrapassagens perigosas e participa de rachas. Nesses casos, a multa chega a R$ 1.915,40 e dobra em caso de reincidência. O motorista também fica sem poder dirigir por um ano. As consequências penais também foram agravadas e há casos em que o condutor pode ser preso.  

“O CTB deve ser cumprido não só porque, se violado, dá origem a uma infração de transito, que é administrativa, mas também porque pode ter consequências civis e criminais. As mais de 40 mil mortes anuais no trânsito não foram acidentes, foram crimes de trânsito, com pena de detenção de até seis anos”, ressalta Gomes. 

Frota cresceu 245% desde 1998; número de mortes em acidentes subiu 40% 

Dados do Denatran (Departamento Nacional de Trânsito) mostram que, desde que o CTB entrou em vigor, a frota de automóveis em circulação no Brasil cresceu 275%. No mesmo período, o número de mortes em acidentes de trânsito aumentou 40%. 

“Embora o número seja alarmante e o governo federal esteja empenhado num esforço global para reduzir o número de acidentes no trânsito, sem a vigência do CTB, a tendência, segundo os técnicos do Denatran, seria ter um total de vítimas ainda maior, levando-se em consideração o crescimento do total de veículos em circulação”, diz o Ministério das Cidades.

Com o incremento da frota, cresceu também o número de infrações. Em 2015, segundo o Denatran, foram aplicadas mais de 13 milhões de multas de trânsito. Um ano antes, em 2014, foram 8 milhões. A maioria por excesso de velocidade. 

Educação para o trânsito


Leis, sozinhas, não alteram as condições de segurança no trânsito. Elas devem fazer parte do comportamento de cada indivíduo. Para isso, é necessário informação e consciência, o que passa pela educação, prevista como obrigatória no capítulo VI do CTB, desde o ensino infantil até o superior. 

Para Ordeli Savedra Gomes, esse é um dos aspectos mais importantes do Código, mas que não saiu do papel.  “Precisamos que os gestores levem o trânsito a sério, que tiremos isso da letra fria do Código e levemos para a vida real. O que se percebe é que alguns órgãos trabalham com educação para o trânsito porque tem mais estruturas. As polícias militares e a Polícia Rodoviária Federal também fazem algum esforço. Mas, na grande maioria dos municípios pequenos do interior, isso não é trabalhado”, alerta. 

A ausência de órgãos de trânsito nas cidades, que também é uma exigência do Código Brasileiro de Trânsito, representa outro desafio para ampliar a conscientização e aprimorar a fiscalização nas vias urbanas, onde os condutores passam a maior parte do tempo. Mas nem 30% dos municípios cumprem a determinação e, assim, não integram o SNT (Sistema Nacional de Trânsito). 

Durante a 2ª Conferência Global de Alto Nível para Segurança no Trânsito da ONU, realizada em novembro de 2015 no Brasil, o ministro das Cidades, Gilberto Kassab, disse que a pasta propõe a criação de consórcios intermunicipais, que seriam responsáveis pela gestão de trânsito nessas cidades de menor porte. Segundo ele, isso atenderá, em parte, os municípios que enfrentam limitações financeiras para se adequarem à legislação. “Mas”, complementou, “não deixará de ser um avanço para chegar às pequenas e médias cidades, que têm tido dificuldade nessa atuação”. 

O representante do Observatório Nacional de Segurança Viária lembra, também, da necessidade de investir os recursos das multas segundo a previsão do Código Brasileiro de Trânsito. E faz um apelo: “os governos precisam levar isso a sério. Que invistam as multas na entrega de material para os agentes de fiscalização, na formação desses profissionais e dos futuros condutores. Precisamos de uma qualificação total na área de trânsito. Então, que invistam, especialmente, em educação para o trânsito”.

FONTE: Natália Pianegonda
              Agência CNT de Notícias