17 ago Aumento de atropelamentos confirma que solução para trânsito está na educação
Postado em 14:00h
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por Trânsito Dinâmico
O normal, quando se fala em trânsito, é analisar estatísticas de acidentes e pensar no reforço da fiscalização. Quanto maior o controle, menor seria a imprudência e o número de vítimas fatais. Porém, tanto a prática de experimentar novas formas de punição aos infratores como a oscilação nas estatísticas comprovam que a compreensão sobre o tema deveria ser outra. “Trânsito é divisão de espaço público, é como eu me comporto perante os demais usuários”, diz a pedagoga Claudia Rübenich. O caminho para conscientização sobre respeito e civilidade nos centros urbanos está, na visão dos especialistas, na educação. Com o avanço de um projeto de lei engavetado no Ministério da Educação, que torna obrigatória a educação para o trânsito nas escolas e nos cursos de Pedagogia, a melhoria do trânsito seria uma consequência.
No último dia 8, Dia do Pedestre, o Departamento de Trânsito do Rio Grande do Sul (Detran-RS) divulgou dados sobre a redução no número de mortes de pedestres nas ruas e estradas gaúchas. Segundo o levantamento, 197 pedestres morreram no primeiro semestre deste ano. Embora o número seja 8,4% menor que o número de vítimas fatais do mesmo período do ano passado, quando 215 pedestres morreram no trânsito, ele continua sendo uma preocupação para os órgãos de trânsito. Juntamente com ciclistas e motociclistas, os pedestres compõem a trinca mais vulnerável de participantes do trânsito.
Segundo o diretor técnico do Detran/RS, Ildo Mário Szinvelski, o atropelamento tem duas causas específicas: a velocidade dos veículos e a distração ou desconhecimento da regras do trânsito pelos pedestres. “Caminhar é a forma mais antiga do transporte humano. Para que isso ocorra com segurança é necessário a mudança cultural de não fazermos das cidades locais que privilegiem apenas os carros. As ciclovias de qualidade e as calçadas amplas são fundamentais para termos mais pedestres e menos condutores”, explica.
De acordo com o diretor, há uma realidade de ‘invisibilidade de pedestres e ciclistas’ no trânsito. “Na lei está previsto que o condutor não pode exceder a velocidade, que o ciclista tem que se equipar, que a circulação dos pedestres tem que ser feita pela direita. Precisamos pegar a norma e transformar em cultura e valores. Todos nós estamos nos digladiando em um ambiente hostil e degradante”, falou.
“Temos uma disputa de espaço físico”, afirma pedagoga
A consciência sobre os papeis de cada sujeito no trânsito é outro aspecto fundamental para uma mudança cultural, acredita a pedagoga Claudia Rübenich. Segundo ela, antiga relação pedestre-motorista revela uma diferença importante para ser considerada na análise dos índices de atropelamentos. “Todo o condutor é pedestre quando desce do carro. Mas, nem todos os pedestres são motoristas. Isso acaba não sendo compreendido e gera uma disputa por espaço físico. A culpa sempre é de um ou de outro”, afirma.
De acordo com a consultora em Educação para o Trânsito, a norma criada em Porto Alegre em 2009, que propõem o sinal da mão ao atravessar a rua, agravou esta relação. “O pedestre que já não entende o contexto do trânsito, ergue a mão em qualquer lugar. Alguns condutores também não estão acostumados com “a gentileza” que entendem ser esta norma e também se passam”, analisa.
Conforme balanço dos sete primeiros meses de 2012 divulgado pela Empresa Pública de Transporte e Circulação (EPTC), a capital gaúcha teve uma queda de 30,8% no número de mortes nas ruas. Foram 54 vítimas entre janeiro e julho deste ano, 24 a menos do que no mesmo período de 2011. Por outro lado, os números confirmam um aumento de 2,85% nos atropelamentos dentro da cidade.mão
A responsável pela Educação para o Transito da EPTC, Léa Ferrão, explica que campanhas de conscientização sobre o sinal da mão são feitas desde o lançamento da norma em Porto Alegre e a intenção é chamar a atenção dos condutores para o respeito ao pedestre. “As pessoas ainda não absorveram que há locais certos para fazer o gesto. Gravaram que tem que fazer o sinal, mas não fazem junto às faixas de segurança. Geralmente passamos a orientação completa e correta. É uma questão pessoal de fazer ou não”, fala.
A falta de uma referência simbólica para a internalização da nova regra ajuda a confundir as pessoas na hora de fazer o gesto da mão, compreende o diretor do Detran –RS, Ildo Mário Szinvelski. “Levantou-se uma série de discussões paralelas entre os atores do trânsito sobre esta conduta que não foram relevantes. O que importa é que o pedestre consiga circular com segurança na cidade, sem a obrigação de que isto esteja relacionado a um gesto específico. É uma questão de conscientização. Só as leis não mudam”, acredita.
Solução: Obrigatoriedade do ensino sobre trânsito nas escolas e faculdades
Apesar dos esforços dos poderes públicos em criar campanhas, reforçar as fiscalizações e adotarem políticas de Educação para o Trânsito, compreender o quanto os sinais influenciam no nosso direito de ir e vir no espaço público não é algo de responsabilidade de quem apenas transmite o conhecimento. Até mesmo o ensinamento dos Centros de Formação de Condutores (CFCs), que a atual gestão do Detran-RS garante ter aperfeiçoado, parece não mudar a consciência das pessoas.
De um lado o responsável pelo órgão de trânsito estadual afirma que “os elevados índices de acidentes aos finais de semana não são situações acidentais, são atos de verdadeira irresponsabilidade”. De outro, a pedagoga com anos de experiência no assunto, lembra que o mesmo motorista que não respeita o pedestre, muitas vezes é o pedestre que não usa a faixa. “O trânsito é um ambiente informal, ninguém se conhece, portanto, não se preocupam tanto com as consequências. Tudo que fizerem, se não forem pegos, ficará no anonimato. Além de que o trânsito é a divisão do espaço público. Será que as pessoas hoje querem dividir seus espaços com outros?”, indaga.
Enquanto a mudança comportamental não se concretiza no Rio Grande do Sul, diversas campanhas, blitzes, operações integradas, projetos escolares independentes, ONGs, etc., lutam pela vida e pela convivência pacífica no trânsito. Porém, o trabalho a conta-gotas poderia ganhar um novo ritmo e eficácia, na avaliação das educadoras, se a legislação torna-se obrigatório este aprendizado nas escolas e cursos de Pedagogia.
“O Código de Trânsito prevê que nas escolas seja abordado este tema, mas fica conforme o interesse de cada escola. O próprio Ministério da Educação não tem uma definição clara sobre este projeto de lei para tornar obrigatório o ensino do trânsito. Nas universidades, apenas os reitores mais sensíveis ao tema adotam o ensinamento nos cursos. Com certeza se a educação abraçasse este assunto, teríamos uma grande mudança”, fala Lea Ferrão.
As escolas interessadas em abordar o tema apresentam projetos e ganham um curso de 90 horas, porém, o interesse tem que partir dos educadores e dos próprios alunos em querer fazê-lo depois. “Poderíamos avançar para um aprendizado mais eficiente e não paliativo. Eu discordo de um aspecto da lei, que substitui o ensinamento no Ensino Médio pelas aulas teóricas da auto-escola. O jovem que a recém completou a idade para poder obter a carteira de habilitação ainda é uma pessoa que vive a fase da auto-afirmação. Está preocupado em tirar carteira para outras coisas, não pensando em ser prudente”, defende Cláudia Rübenich.
Fonte: Sul21